Por sermos mulheres já possuímos uma identidade, mas a pergunta é:
nascemos assim, com essa divisão de gênero, ou nos tornamos homens e mulheres?
O gênero mulher já nos confere um lugar na sociedade, isso pode nos trazer
certas limitações, uma vez que nossa sociedade tem uma história que é baseada
na sociedade patriarcal, ainda hoje ela carrega esses traços.
Podemos dizer que existem barreiras e também oportunidades que se
estendem ao tipo de sociedade, de cultura, a temporalidade e ao espaço em que
ocorrem., Faz-se necessário aqui uma distinção entre gênero e sexo.
“A palavra sexo provém do latim, sexus e refere-se à
condição orgânica que distingue o macho da fêmea. Sua principal característica
reside na establidade através do tempo. A categoria de gênero provém do latim
genus e refere-se ao código de conduta que rege a organização social das
relações entre homens e mulheres. Sua principal característica esta na
mutabilidade”.( YANNOULAS et al, 2000, p. 427)
O
conceito de gênero é mais abrangente, mais cultural, podemos dizer que em
termos de poder, existe uma desigualdade muito grande entre homem e mulher, com
a mulher em desvantagem. Cabe aqui uma investigação sobre a educação ter sido
considerada por muito tempo atribuição feminina. Se voltarmos um pouco no
tempo, veremos que a religião teve influência nesse papel atribuído a mulher.
Escolas femininas onde os educadores são mulheres, a própria bíblia tem
várias passagens onde diz como a mulher deve se portar e o que se deve esperar
dela. Aos poucos a mulher vai sendo moldada, despersonalizada e adquirindo
atribuições e deveres que lhe são impostos como coisas que são de
mulheres.Conceitos criados por uma sociedade
desigual, onde existe a
predominância do gênero masculino
sobre o feminino, assim como o que cabe a cada um foi sendo legitimado através
dos tempos, a profissão de professora ficou muito mais a cargo da mulher.
É sabido que a maior parte do corpo docente das escolas é formado por
mulheres, historicamente sabemos que esse papel nos foi empurrado pela igreja,
pelos homens, a mulher era considerada o sexo frágil, tinha que tomar conta do
lar, dos filhos e do marido, no máximo podia lecionar, pois estaria fazendo
algo que lhe cabia, que era educar. Se não casasse, então seria uma opção para
que pudesse sobreviver, essa era a missão e a vocação da mulher.
Com a predominância da mulher na carreira do magistério, era natural que
ocorresse a feminização do ensino, e ainda hoje em pleno século XXI ainda existe a idéia de que a mulher tem mais
vocação para o magistério. Por muito tempo ser professora era considerado a
única profissão respeitável e o único trabalho tolerado, ser professora era um
prolongamento de ser mãe, dona de casa, boa esposa, ou seja, éramos consideradas
quase seres assexuados.
Segundo Bruschini (1988), “Embora o encargo da mulher com a socialização
infantil seja fruto da divisão sexual do trabalho, diferenças biológicas são
invocadas para justificar esse fato como natural. Daí a considerá-lo uma
vocação é apenas um pequeno passo”.
Com a feminização do magistério ocorre também a desvalorização da
profissão, com salários menores, percebe-se que os homens procuram por
trabalhos mais valorizados e melhor remunerados. Essa cultura em que é atribuído a mulher um
papel passivo não se sustenta mais, uma vez que existem variantes culturais que
não podem ser negadas, e dentro de uma mesma cultura e sociedade também existem
variantes.
A
identidade feminina sempre foi vinculada ao gênero, assim a sociedade impõe a
cada um o seu papel, o homem é o provedor, e a mulher a mãe, dona de casa, etc,
esse papel de submissão à autoridade do homem teve seus momentos de
insubordinação, algumas mulheres marcaram épocas por isso, tivemos alguns
movimentos feministas mostrando que essa posição que nos foi imposta não nos agradava muito.
A
partir da industrialização a mulher viu que poderia tomar outros rumos,
participar do mercado de trabalho atuando em outras áreas que não fosse só o
magistério. Mas esse novo mercado de
trabalho que se abria era inadequado, e continuava a não valorizar as mulheres,
os salários continuavam baixos, as leis eram precárias, no sentido de
ofereceram benefícios as mulheres, principalmente as gestantes, e as mulheres
continuavam sem voz ativa nas decisões.
A
inserção das mulheres no mercado de trabalho, nas universidades, na política, e
na sociedade como um todo, aconteceu de forma lenta e gradual. Houve um
processo de desvalorização social da mulher que perdurou por muitos anos e veio
refletir na profissão de professora que era uma profissão eminentemente
feminina, por tudo que já foi dito aqui dá para perceber que a desvalorização
da mulher reflete no exercício do magistério, uma vez que afeta salário e nos
impõe condições precárias de trabalho.
O
educador Paulo Freire nos mostra em seu livro “Professora Sim, Tia Não” que a tarefa de ensinar é uma ação
profissional. O fato de professoras serem chamadas de tias é uma forma sutil de
desvalorização da profissão, porque para ser tia não é necessário especialização, não é necessário
ser uma profissional, qualquer um pode ser, vai depender do parentesco. Essa forma de nos caracterizar como tia
também é uma maneira de nos fazer calar, de nos desencorajar na luta por aquilo
que achamos justo.
Por todos os argumentos utilizados podemos perceber que ao longo da
história vários foram os fatores que nos levaram a feminização do magistério, a
desvalorização principalmente por ser mulher, esse fato já nos coloca em
situações que podem ser boas ou não. É necessário entender como se forma a
identidade. Habermas nos diz que:
A identidade é gerada pela socialização, ou
seja, vai se processando à medida que o sujeito - apropriando-se dos processo
simbólicos – integra- se antes de tudo, num certo sistema social, ao passo que,
mais tarde, ela é garantida e desenvolvida pela individualização, ou seja,
precisamente por uma crescente independência em relação aos sistemas sociais.(
apud Cruz, 1997:37)
A
evolução e as mudanças sócio-políticas ocorridas no século passado
principalmente em relação a identidade feminina, faz com que cada vez mais, as
mulheres ocupem espaços antes considerados masculinos, chefiem famílias, são
mantenedoras, ocupam cargos de chefias em empresas, em nações, destacam-se na política e em todas as áreas que os homens atuam, mas
mesmo assim ainda existe discriminação, preconceito e desigualdades.
Quando falo em desigualdades não estou falando das diferenças que
existem entre ser homem ou ser mulher, e sim, das desigualdades criadas por
nossa sociedade ao longo da história. As
diferenças existem mas não são
defeitos e não devem ser consideradas
negativas. Devemos ter outro olhar sobre esse assunto e nos percebermos como
aprendizes, questionando o que entendemos por diferenças, problematizar aquilo
que é conhecido, que é tido como natural, como certo.
O
fato é que as mulheres ainda tem um longo caminho a percorrer. A sociedade em
geral ainda é machista, ainda predomina a mentalidade da mulher ser o sexo
frágil.
Neste contexto podemos afirmar que a mulher professora vem sendo
produzida ao longo da história pelos conceitos criados em torno de ser mulher,
pois ser mulher não pode ser reduzido a
simplesmente ser feminino, envolve processos culturais e sociais, envolvem
séculos de culpa que a mulher carrega, principalmente por querer ser a mulher
ideal. Deveres foram impostos as mulheres e elas nem questionam porque e por
quem, não dá para se espantar quando notamos que às vezes existe uma confusão
entre o magistério e a maternidade, ambos parecem ligados pois a professora
acaba sendo uma mãe que tenta atender as necessidades dos seus alunos, claro
que aqui falamos de uma mãe no sentido figurado e não biológico.
Esse papel nos foi atribuído ao longo da história e fica difícil mudar
esse paradigma, mas não impossível, tanto que as mudanças estão ocorrendo,
agora podemos pensar que é professora quem quer, pelo menos quero pensar que a
maior parte pensa assim. O desafio aqui é
quebrar as regras desse jogo de poder que nos desfavorece, romper os
limites de sexo, de gênero, classe social, raça, fazermos nossas escolhas, nos
posicionarmos no mundo, na vida por nós mesmas, e não por imposição cultural.
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