domingo, 8 de março de 2015

AS RELAÇÕES ENTRE MULHERES, EDUCAÇÃO E ESCOLA- A PROFISSÃO: PROFESSORA

Por Mariene Hildebrando 
     Por sermos mulheres já possuímos uma identidade, mas a pergunta é: nascemos assim, com essa divisão de gênero, ou nos tornamos homens e mulheres? O gênero mulher já nos confere um lugar na sociedade, isso pode nos trazer certas limitações, uma vez que nossa sociedade tem uma história que é baseada na sociedade patriarcal, ainda hoje ela carrega esses traços.
       Podemos dizer que existem barreiras e também oportunidades que se estendem ao tipo de sociedade, de cultura, a temporalidade e ao espaço em que ocorrem., Faz-se necessário aqui uma distinção entre gênero e sexo.

“A palavra sexo provém do latim, sexus e refere-se à condição orgânica que distingue o macho da fêmea. Sua principal característica reside na establidade através do tempo. A categoria de gênero provém do latim genus e refere-se ao código de conduta que rege a organização social das relações entre homens e mulheres. Sua principal característica esta na mutabilidade”.( YANNOULAS et al, 2000, p. 427)

      O conceito de gênero é mais abrangente, mais cultural, podemos dizer que em termos de poder, existe uma desigualdade muito grande entre homem e mulher, com a mulher em desvantagem. Cabe aqui uma investigação sobre a educação ter sido considerada por muito tempo atribuição feminina. Se voltarmos um pouco no tempo, veremos que a religião teve influência nesse papel atribuído a mulher.
      Escolas femininas onde os educadores são mulheres, a própria bíblia tem várias passagens onde diz como a mulher deve se portar e o que se deve esperar dela. Aos poucos a mulher vai sendo moldada, despersonalizada e adquirindo atribuições e deveres que lhe são impostos como coisas que são de mulheres.Conceitos criados por uma sociedade  desigual, onde existe a  predominância do gênero  masculino sobre o feminino, assim como o que cabe a cada um foi sendo legitimado através dos tempos, a profissão de professora ficou muito mais a cargo da mulher.
       É sabido que a maior parte do corpo docente das escolas é formado por mulheres, historicamente sabemos que esse papel nos foi empurrado pela igreja, pelos homens, a mulher era considerada o sexo frágil, tinha que tomar conta do lar, dos filhos e do marido, no máximo podia lecionar, pois estaria fazendo algo que lhe cabia, que era educar. Se não casasse, então seria uma opção para que pudesse sobreviver, essa era a missão e a vocação da mulher.
       Com a predominância da mulher na carreira do magistério, era natural que ocorresse a feminização do ensino, e ainda hoje em pleno século XXI  ainda existe a idéia de que a mulher tem mais vocação para o magistério. Por muito tempo ser professora era considerado a única profissão respeitável e o único trabalho tolerado, ser professora era um prolongamento de ser mãe, dona de casa, boa esposa, ou seja, éramos consideradas quase seres assexuados.
       Segundo Bruschini (1988), “Embora o encargo da mulher com a socialização infantil seja fruto da divisão sexual do trabalho, diferenças biológicas são invocadas para justificar esse fato como natural. Daí a considerá-lo uma vocação é apenas um pequeno passo”.
      Com a feminização do magistério ocorre também a desvalorização da profissão, com salários menores, percebe-se que os homens procuram por trabalhos mais valorizados e melhor remunerados.  Essa cultura em que é atribuído a mulher um papel passivo não se sustenta mais, uma vez que existem variantes culturais que não podem ser negadas, e dentro de uma mesma cultura e sociedade também existem variantes.
     A identidade feminina sempre foi vinculada ao gênero, assim a sociedade impõe a cada um o seu papel, o homem é o provedor, e a mulher a mãe, dona de casa, etc, esse papel de submissão à autoridade do homem teve seus momentos de insubordinação, algumas mulheres marcaram épocas por isso, tivemos alguns movimentos feministas mostrando que essa posição que nos foi  imposta não nos agradava muito.
     A partir da industrialização a mulher viu que poderia tomar outros rumos, participar do mercado de trabalho atuando em outras áreas que não fosse só o magistério.  Mas esse novo mercado de trabalho que se abria era inadequado, e continuava a não valorizar as mulheres, os salários continuavam baixos, as leis eram precárias, no sentido de ofereceram benefícios as mulheres, principalmente as gestantes, e as mulheres continuavam sem voz ativa nas decisões.
     A inserção das mulheres no mercado de trabalho, nas universidades, na política, e na sociedade como um todo, aconteceu de forma lenta e gradual. Houve um processo de desvalorização social da mulher que perdurou por muitos anos e veio refletir na profissão de professora que era uma profissão eminentemente feminina, por tudo que já foi dito aqui dá para perceber que a desvalorização da mulher reflete no exercício do magistério, uma vez que afeta salário e nos impõe condições precárias de trabalho.
     O educador Paulo Freire nos mostra em seu livro “Professora Sim, Tia Não” que a tarefa de ensinar é uma ação profissional. O fato de professoras serem chamadas de tias é uma forma sutil de desvalorização da profissão, porque para ser tia não é  necessário especialização, não é necessário ser uma profissional, qualquer um pode ser, vai depender do parentesco.  Essa forma de nos caracterizar como tia também é uma maneira de nos fazer calar, de nos desencorajar na luta por aquilo que achamos justo.
     Por todos os argumentos utilizados podemos perceber que ao longo da história vários foram os fatores que nos levaram a feminização do magistério, a desvalorização principalmente por ser mulher, esse fato já nos coloca em situações que podem ser boas ou não. É necessário entender como se forma a identidade. Habermas nos diz que:
    A identidade é gerada pela socialização, ou seja, vai se processando à medida que o sujeito - apropriando-se dos processo simbólicos – integra- se antes de tudo, num certo sistema social, ao passo que, mais tarde, ela é garantida e desenvolvida pela individualização, ou seja, precisamente por uma crescente independência em relação aos sistemas sociais.( apud Cruz, 1997:37)

     A evolução e as mudanças sócio-políticas ocorridas no século passado principalmente em relação a identidade feminina, faz com que cada vez mais, as mulheres ocupem espaços antes considerados masculinos, chefiem famílias, são mantenedoras, ocupam cargos de chefias em empresas,  em nações, destacam-se na política  e em todas as áreas que os homens atuam, mas mesmo assim ainda existe discriminação, preconceito e desigualdades.
     Quando falo em desigualdades não estou falando das diferenças que existem entre ser homem ou ser mulher, e sim, das desigualdades criadas por nossa sociedade ao longo da história.  As diferenças existem  mas não são defeitos  e não devem ser consideradas negativas. Devemos ter outro olhar sobre esse assunto e nos percebermos como aprendizes, questionando o que entendemos por diferenças, problematizar aquilo que é conhecido, que é tido como natural, como certo.
     O fato é que as mulheres ainda tem um longo caminho a percorrer. A sociedade em geral ainda é machista, ainda predomina a mentalidade da mulher ser o sexo frágil.
     Neste contexto podemos afirmar que a mulher professora vem sendo produzida ao longo da história pelos conceitos criados em torno de ser mulher, pois ser mulher  não pode ser reduzido a simplesmente ser feminino, envolve processos culturais e sociais, envolvem séculos de culpa que a mulher carrega, principalmente por querer ser a mulher ideal. Deveres foram impostos as mulheres e elas nem questionam porque e por quem, não dá para se espantar quando notamos que às vezes existe uma confusão entre o magistério e a maternidade, ambos parecem ligados pois a professora acaba sendo uma mãe que tenta atender as necessidades dos seus alunos, claro que aqui falamos de uma mãe no sentido figurado e não biológico.
     Esse papel nos foi atribuído ao longo da história e fica difícil mudar esse paradigma, mas não impossível, tanto que as mudanças estão ocorrendo, agora podemos pensar que é professora quem quer, pelo menos quero pensar que a maior parte pensa assim. O desafio aqui é  quebrar as regras desse jogo de poder que nos desfavorece, romper os limites de sexo, de gênero, classe social, raça, fazermos nossas escolhas, nos posicionarmos no mundo, na vida por nós mesmas, e não por imposição  cultural.


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